Há semanas atrás, já em plena quarentena e quaresma, motivadas  pela pandemia inesperada e pela saída do Carnaval e a esperança de regeneração da Paixão de Cristo, uma interessante frase chegou à diversas redes sociais, acompanhada de uma cadeirinha com o globo terrestre assentado nela: “e, de repente, o Papai do Céu colocou todo o mundo na cadeirinha do pensamento”.

Verdade! Desde que o mundo é mundo, confiou-se em tantos poderes e deuses, cada um significando domínio da situação. Quando se pensa na Igreja Primitiva, fundada por Jesus Cristo e divulgada sobre estradas construídas pelos quarteis de Roma, filosofia e arte grega, tudo parecia normal. Mas quando o cristianismo se opôs ao modo de vida da sociedade em questão, aconteceu a ruptura da estrutura social. Pão e circo, dominados pelo deus falso César, força física e organização não foram suficientes para a ruína do sistema secular vigente.

1. Cadeirinha do pensamento para o domínio religioso

A longa Idade Média, sob o domínio e promessa de que a Igreja Oficial Cristã, sendo ao mesmo tempo, religião e domínio totalitário, foi outra decepção. A sociedade sentiu o peso de sua mão de ferro, que segurou para a cúpula do alto clero todo o conhecimento da Palavra de Deus e todo o desenvolvimento social e científico. Haja mortandade, injustiça, perseguição! Quando a Renascença foi aparecendo, junto com o declínio do poderio católico, o caos e a ignorância imperavam em boa parte da civilização ocidental. Durante algum tempo, as lutas demonstraram que a sociedade de justiça, iniciativa e pensamento livre. Novas invenções como a imprensa e o papel deram acessibilidade à mais informações. Bússola e pólvora trouxeram novos mundos, viagens e domínio armado. Domínio religioso cristão não deu certo.

2. Cadeirinha do pensamento para o Racionalismo e o Positivismo

Liberdade, fraternidade e igualdade, bandeiras da Revolução Francesa, prometeram excelentes soluções para a sociedade em pleno desenvolvimento. Muitos livros foram escritos, muito boa filosofia. Foi o início da Sociologia, como ciência, sob o chão do positivismo de Auguste Comte (1798-1857), e o cartesianismo de Rene Descartes (1596-1650). A ciência floresceu, a música se desenvolveu, lindas obras, novos instrumentos e técnicas. Nova promessa: muito bem, se houver um plano organizado e amor, tudo dará certo. E foram-se indo as reformas, as revoluções, os planos, as sistematizações. Deus foi dispensado dos planos em muitos casos, pois se as coisas fossem feitas na ordem certa, haveria progresso.

A virada do século 19 para o 20 trouxe novos e muito maiores problemas. Guerras, divisões, segregações, preconceitos vieram junto com novos remédios, ciência , telescópios, revoluções sociais, trazendo um mundo dividido entre capitalismo e comunismo. Imigrações para o novo mundo, promessas de que as soluções estariam nos planos humanos acabaram junto com a Primeira e Segunda Guerra Mundial. Os historiadores as veem como uma só. Cadeirinha do pensamento de novo. Racionalismo, positivismo, não resolveram as grandes questões da humanidade.

3. Cadeirinha do Pensamento para a Pós-Modernidade

E agora? A sociedade ocidental colocou tudo em xeque:  valores, igreja, o ser humano em si e suas instituições. Pós-modernidade não significa que a modernidade passou, porém trouxe a flexibilização e formatação de todas as ciências e de toda a religião para o que Zigmund Baumann (1925-2017) chamou de “modernidade líquida”. Muitos protestos sociais pelo mundo, contra tudo e contra todos. Então, igrejas e sociedades se apresentam no formato que agrada, adaptando-se ao consumo e necessidade do momento. O líquido se adapta às instituições, famílias, escolas, saberes.  Nada é fixo. O sucesso é medido de acordo com o número de seguidores. Multidões lotam templos atrás de shows com muitas luzes, com milagres, música eletrizante e promessas de que “Jesus te ama”. Redes sociais movimentam bilhões de pessoas em torno de imagens líquidas, que satisfazem a quem desejam satisfazer, com a cor, música, culto, mensagem e produtos dirigidos a determinado público, já magnetizado pela oferta antecipada feita pelo marketing.  

De repente, tudo parou. Sem multidões, sem shoppings, sem ostentação. A ciência que resolvia tudo, não resolveu. O poder da prosperidade pregada, também não. O homem volta ao início de sua vida cristã, com a impressão de que um Coliseu cheio de gente que vem atrás de pão e o show do circo não é vida. É morte.

Sim, cadeirinha do pensamento é o que se precisa, em todas as instituições do mundo globalizado. Consumir a espiritualidade presente em redes sociais, não resolve. Consumir o produto largamente oferecido pela pluralidade e pela Individualização, também não. É hora, de verdade, do povo cristão se colocar na cadeirinha do pensamento, para saber que o fio condutor do universo não é o plano, não é a ciência, não é o meio de comunicação. O plano de Deus para o mundo e a sociedade é que as pessoas conheçam Jesus através do amor que se tem por aqueles que nos cercam.  “Nisto conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros” (Jo 13.35). Palavras de Jesus, para a Igreja e a sociedade novamente e subitamente na cadeirinha do pensamento. Mais do que sinais dos tempos do fim, também é o momento importante de avaliar o que deu errado, e voltar para a Bíblia.

Ma. Hariet Wondracek Kruger
Professora na FBP